Cirurgia do Joelho

Instabilidade femoropatelar

A patela é um osso sesamóide localizado na região anterior do joelho entre os tendões quadríceps e patelar. Formada por duas facetas (lateral e medial), possui a cartilagem articular mais espessa do corpo humano. Tem como principal função aumentar o torque de força do aparelho extensor do joelho. Articula-se com a região do fêmur distal denominada tróclea que também é constituída por duas facetas, sendo a lateral mais proeminente.

A instabilidade femoropatelar caracteriza-se por luxação (deslocamento) recorrente da patela em relação à tróclea femoral. Mais comumente acomete meninas, com início dos sintomas entre os 10 e 17 anos de idade. Geralmente existem alterações anatômicas ósseas e tendinosas que contribuem para a instabilidade lateral de patela. Uma delas é odesvio em valgo do joelho que ocasiona lateralização excessiva da patela durante a flexão, podendo resultar em luxação. Outra situação comum é a displasia troclear onde a congruência femoropatelar encontra-se alterada. Também podemos encontrar rotação interna do quadril e externa da tíbia.

Luxação lateral de patela.

A. Tróclea femoral com aspecto normal. B. Tróclea femoral displásica (rasa).

O primeiro episódio pode ocorrer em situações corriqueiras como caminhar ou durante a prática de esportes. Muitas vezes a patela reduz espontaneamente com a simples extensão do joelho realizada pelo próprio paciente. Neste primeiro momento, estará indicado tratamento cirúrgico apenas se houverem fraturas osteocondrais associadas, caso contrário opta-se pelo tratamento conservador. Entretanto, a literatura demonstra índices de reincidência de luxação entre 15% e 44% após a abordagem inicial não-cirúrgica. Logo, à partir do segundo episódio de deslocamento da patela é necessária a intervenção cirúrgica, tendo como principal finalidade diminuir a instabilidade femoropatelar. Em casos crônicos, após vários episódios de luxação, podem surgir lesões cartilaginosas resultando em dor para situações como subir e descer escadas, sentar, agachar, etc.

O diagnóstico é realizado através da anamnese, do exame físico e de exames de imagens. Durante a avaliação clínica observamos a marcha em busca de sinais de aumento da rotação interna do quadril e da rotação externa da tíbia, pois estas alterações aumentam significativamente o risco de luxação lateral da patela. Também quantificamos o ângulo de valgismo do joelho (ângulo Q) que quando maior que 20o eleva o risco de deslocamento patelar.

O teste de apreensão (Smillie) demonstra a presença de hipermobilidade patelar. Com o paciente deitado e o joelho em extensão realiza-se lateralização da patela associada a flexão progressiva do joelho. Caso exista instabilidade, o paciente interromperá o teste devido a sensação de luxação iminente da patela.

Na radiografia em perfil do joelho podemos avaliar a altura patelar e possíveis displasias trocleares. A altura patelar é determinada pela divisão do comprimento do tendão patelar pelo comprimento da patela (índice de Insall-Salvati). Valores acima de 1,2 determinam patela alta e estão associados a maior risco de instabilidade femoropatelar. As displasias trocleares são diagnosticadas a partir de alguns sinais característicos como o esporão supra-troclear, sinal do cruzamento e do duplo contorno. Já na incidência axial é possível estudar a morfologia da tróclea femoral, o formato da patela, a inclinação patelar e possíveis fraturas osteocondrais.

A tomografia computadorizada tem papel importante para definição do tratamento cirúrgico. Através deste exame podemos avaliar a morfologia da tróclea femoral, a inclinação patelar, desvios rotacionais do fêmur e tíbia, além de mensurar a distância do centro da tróclea femoral a inserção do tendão patelar (TA-GT). Na ressonância magnética observamos o ligamento patelo femoral medial e outras lesões associadas (osteocartilaginosas, meniscais, ósseas ou ligamentares).

Dentre as opções de tratamento cirúrgico a mais realizada atualmente é a reconstrução do ligamento patelofemoral medial. Esta estrutura localiza-se na face medial do joelho, estendendo-se do quadrante súpero-medial da patela até a região póstero-medial do fêmur distal. Tem como principal função evitar a lateralização de patela durante a flexão do joelho. Caso não existam alterações significativas na anatomia óssea, a reconstrução deste ligamento apenas será suficiente para prevenir novos episódios de luxação. Dispomos de diversas técnicas para refazê-lo, porém, a mais utilizada requer a utilização de enxerto do tendão semitendíneo. Nesta, retiramos o tendão localizado na tíbia proximal, depois o mesmo é fixado na face medial da patela com duas âncoras ósseas. Então, é passado através de um túnel ósseo perfurado no fêmur distal e fixado com um parafuso de interferência. O período pós-operatório é de cerca de quarenta e cinco dias, sendo que utilizamos imobilização por 3 semanas.

Reconstrução do ligamento patelofemoral medial.

Em casos com lateralização excessiva da inserção do tendão patelar (TA-GT superior a 20mm) está indicada a medialização da tuberosidade anterior da tíbia. Neste procedimento, realiza-se uma osteotomia longitudinal na inserção do tendão patelar seguida de deslocamento medial e fixação com parafusos corticais. O principal objetivo é diminuir o índice TA-GT para em torno de 10-12mm.A osteotomia da tuberosidade anterior de tíbia também pode ser utilizada para correção da altura patelar,em situações com índice Caton-Dechamps superior a 1,2 pode-se proceder com a distalização do tendão patelar.

Osteotomia de medialização da tuberosidade anterior da tíbia.

Outra opção é a trocleoplastia, realizada em pacientes com displasia significativa de tróclea femoral. Entretanto, é um procedimento pouco utilizado devido aos resultados incertos, principalmente devido ao risco de danos a cartilagem articular.

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